Textos

Barco Sem Rumo

Uau, méne, uau! Estou num daqueles momentos, nem consigo escrever direito! De repente não estou na Nigéria, sentado nas escadas que dão para o terraço, de tronco nu com o computador no colo. De repente estou no Clio, com o Gordy, a caminho de Coimbra, a ouvir Sparta. De repente não passaram sete, oito, nove anos, de repente não passou tempo nenhum entre agora e antes, de repente tudo é o mesmo!

Quem é que eu era naquela altura? Fónix, será que tinha a mais pequena ideia de que aos trinta ia estar aqui, todo partido, com as costas e as pernas doridas, com o dono do hotel a espreitar por detrás do meu ombro a ver o que escrevo sem entender nada? Que voltas que a minha VIDA deu, méne! Mas estou contente! Todo partido, mas contente! Estou a fazer o que quero, e não há nada melhor que isso!

“Estás bronzeado” diz o dono, olhando para os meus braços mais escuros que as costas.

“Sim, os brancos têm muitas cores” respondo, com um sorriso.

Não, naqueles tempos não fazia ideia do que ia andar a fazer por estes dias. Como podia? A minha VIDA tem sido uma sucessão de tropeções espectaculares que me trouxeram até aqui. Acho absolutamente incrível e fascinante a casualidade, não apenas da minha VIDA, mas da VIDA de toda a gente. O engano da Universidade de Coimbra com a minha candidatura que me fez ir para a Noruega, a Inglaterra, a Índia, a Ásia, África! Tudo aos empurrões, oportunidades à estalada, e fui agarrando algumas que apareciam primas de sorrisos. Que demais! Gosto de achar que tenho controlo, mas a maior parte das vezes é um barco sem rumo e vou fazendo o que posso. Como é incrível toda a casualidade! Faz-me adorar estar vivo, faz-me adorar mais estas cenitas, como enfiar um pé na lama ou ver os pingos de chuva torrencial a esmagar o asfalto à minha frente. Faz-me ver tudo como um grande e interminável filme que só pode acabar bem!

Neste momento, morrer é pouco para mim! Sinto que tenho a VIDA toda aqui no meu embalo, e isso faz-me sentir que qualquer ponto final não pode nunca apagar tudo o que já aconteceu. Que se apague o sol, que a Via Láctea mergulhe no buraco negro que namora, eu agora sinto que estou aqui, méne, e sinto que isto está a acontecer! Eu sinto-me aqui!

18h06, 2ª, 22 de Setembro de 2014
Agbor, Nigéria

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