Textos

Ambivalência na Nigéria

Sinto-me dividido. Está a ser-me difícil manter-me impermeável ao que me dizem da Nigéria. Mas talvez seja por alguma razão… desta vez não são os média que falam comigo, mas pessoas que por aqui andam… o amigo ciclista do Javier a quem roubaram tudo apontando uma pistola, a Moronke que, há anos, teve três pessoas em casa armadas, a amiga da Ema que morreu na semana passada num assalto…

Se por um lado quero pedalar e voltar àquela rotina de andar vários dias seguidos, acampar aqui ou ali, ser albergado espontaneamente, por outro também sinto que nem sempre vejo com maus olhos partir “no dia a seguir”. Hoje fui reparar a minha Bicicleta e notei que me agradou o facto de atrasar um pouco,
pois isso seria uma boa desculpa para partir de Ikorodu só amanhã. E porquê?

Estive onze dias em Lagos sem pedalar, a sentir-me preso, a querer estrada. E, no primeiro dia, faço trinta quilómetros, fico em casa de alguém e à primeira desculpa quero ficar mais um dia a… “descansar”. Só pode ser por não me sentir verdadeiramente à vontade a pedalar nos dias que correm. E como sei que o vou fazer, custe o que custar, vou preferindo adiar, como um puto, em vez de apanhar um autocarro. Apanhar um autocarro não seria cobardia mas, ainda assim, e apesar de tudo o que acontece, continuo sem saber qual a probabilidade de algo me acontecer a mim. Não senti ainda nenhuma má onda na minha direcção, tirando aqueles que me chamam Boko Haram, e isso vai fazendo com que queira continuar.

Se algo acontecer… tentei. Desde que não morra nem fique paralítico ou algo do género, vou tentar seguir caminho.

17h00, 4ª, 17 de Setembro de 2014
Ikorodu, Nigéria

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