Estórias em Vão [2007]Ficção

Viver Sozinha…

Seis e meia! Que seca, nada para fazer. Bem que podia comprar o jornal e procurar um emprego… Mas para quê? O dinheiro que a mi­nha família me deixou chega bem. E mais o subsídio de desemprego que ganho, dá para até ter alguns luxos. Mas o tempo podia passar mais depressa se fizesse alguma coisa… Passo os dias aqui fechada, ora a ver televisão, na internet a ver sites pornográficos e a mastur­bar-me, enfim, que VIDA…

Desligo a televisão, vou buscar a mesma revista de sempre e dei­to-me no sofá. Desaperto as calcas de ganga que respiram aliviadas, baixo-as até aos tornozelos e masturbo-me mais uma vez. Será que estou a ficar viciada? Segunda vez num dia… Com cinquenta e dois anos e ainda nisto… No fim acabo por adormecer, por pouco mais de duas horas. Sonho que conheço um homem, sempre a mesma merda de sonho, que só me faz ficar tão desiludida quando acordo…

Olho o relógio e são quase nove horas. Vou à cozinha e ponho a aquecer a comida do meio-dia. Cozinho sempre a mais ao meio-dia para depois ao jantar só ter de aquecer. Poupo trabalho… Enquanto a comida aquece, tomo um duche. Depois do champô, sabonete, creme hidratante, amaciador, creme anti-celulite, auto-bronzeador e desodorizante, dirijo-me ao quarto, onde me visto. Calças de gan­ga justas, uma blusa azul escura com um decote grande, casaco de seda azul por cima. Como frango e arroz e bebo uma garrafa de vinho tinto nacional (apesar de não apreciar muito vinho finlan­dês), vendo televisão, e demoro mais de uma hora. Por fim, quando chegam as 23h, vou sair. Não combino nada com ninguém (não teria também muita gente com quem combinar), quero estar livre, nunca se sabe.

Completamente tonta (uma garrafa de vinho para uma senhora não é pouco), vou com calma pela rua, Kauppakatu. Uma das coi­sas que aprecio em Jyvaskyla é a noite. Cheia de estudantes, cheia de estudantes estrangeiros, um bom ambiente. Penso durante um segundo e decido ir ao Fever. Quando chego, após pagar 4€ para entrar, mais 1,20 € para deixar o casaco, vou para o bar. Está cheio hoje, bom! A primeira coisa que faço é pedir uma cerveja. Aí fico, encostada ao bar, bebendo cerveja atrás de cerveja. Uma banda toca covers de músicas modernas. Vou bebendo, esperando que acabe, e sempre olhando à volta, nas esperança que alguém troque um olhar comigo.

Quando é uma da manhã e seguramente muita gente já esta bê­beda (é mais fácil assim) vou para a pista. Por esta hora já muita gente da minha idade dança, com o mesmo propósito que eu. Eis que avisto um jovem, não deve ter mais de vinte e quatro anos. Tem aspecto de sul da Europa, Itália, Espanha… Ou Portugal, sim. Com um aspecto descontraído, cabelo mais ou menos grande e escuro, calcas de ganga azuis e uma t-shirt da mesma cor que diz “LIFE is Skaté (What Else?)”. Eu dizia-lhe ‘what else’… Aproximo-me e co­meço a fixá-lo. O rapaz não precisa de muito tempo para perceber. Coitado, tenta fazer com que eu não perceba, mas eu percebi que ele percebeu. Mas não olha para mim, não faz caso… Decido-me! Aproximo-me mais e toco-lhe no ombro, chamando-o para dançar. Coitado… Faz um sorriso envergonhado e diz que não, virando-se lentamente para outro lado. Espera cinco minutos, para eu não pen­sar que abandona a pista por minha causa, e sai, indo ter com dois amigos altos, de aspecto de Norte da Europa.

A noite passa, e volto a casa, uma vez mais, sozinha… Que pobre espírito sou… O que fazer para sair desta merda de VIDA? Sei exac­tamente o que o rapaz deve ter pensado, algo como “ups, que é que esta mulher quer? Coitada, mais de cinquenta anos e a atirar-se a um rapaz de vinte”… A VIDA torna-se tão desesperada quando não temos ninguém… Viver sozinha não é viver. Viver sozinha é viver com o objectivo de mudar radicalmente a sua VIDA. E viver com este pensamento 24 horas por dia, é sinal que a nossa existência não vai bem…

Leave a Reply

Your e-mail address will not be published. Required fields are marked *