– Diz-me que vais amar-me para sempre. – Acho que foi aqui, neste preciso instante, que vi tudo acabar. Não que fosse uma pergunta inédita, já tínhamos falado nisso algumas vezes, sem acabar com a relação. Mas naquele instante, no momento em que foi, na altura da nossa relação, tudo parecia dizer-me que aquela pergunta encerrava tudo. Estávamos deitados, eu de barriga para cima, ela a meu lado. Podia ter dito mil e uma coisas, mudar de assunto, fazer promessas, mas eu não sou assim… Se calhar devia ser, mas não sou. Bem, mas não interessa nada isso, tive de dizer o que ia dentro de mim…
– Sabes que nunca penso no futuro. – Disse, continuando a mirar o tecto. Não estava a olhar para ela, mas poderia descrever exactamente a sua expressão. Acho que no fundo já sabia o que ia responder. Não sei… Não consigo, não quero mudar. Sei que devia fazer cedências, tentar mudar, mas conheço-me, e sei que se não for fiel a mim mesmo não me sinto bem. Mas eu tentei, ela seguramente pensa que não, mas tentei. Quantas noites cheguei a sua casa com um filme e pipocas, disposto a passar uma noite sossegada com ela? E quantas vezes ela adormecera no sofá, deixando-me a ver o filme “sozinho”? Não a condenava, subia-lhe o cobertor, dava-lhe um beijo na cabeça e ia lá fora, respirar a noite e pensar.
Levantou-se e começou a vestir-se. Eu olhava para ela, como que tentando gravar na minha memória estes últimos momentos passados com ela. Apesar de tão diferente de mim, nos últimos tempos, desde que entrara na minha VIDA contribuíra para uma certa estabilidade, um “não me sentir sozinho”. Adorava-a, e gostava de estar 50
com ela. Não sei se vamos continuar a ser amigos ou não, acho difícil, estar com ela como amigo, talvez sempre a pensar no que passou… Não acabamos a relação chateados, isso não. Desde o inicio, quando no Teatro Gil Vicente íamos ver aquela peça (que não me recordo), beijamo-nos, como que num acto de confirmação do romance que crescia de dia para dia, e fiz questão de lhe dizer:
– Eu gosto de ti, gosto muito de ti e gosto de estar contigo. Mas não sei se gostas da maneira como encaro a VIDA. Contudo é justo dizer-te, que não consigo, nem quero, mudar… Se ficares comigo, tudo o que te posso dar é o “agora”, nunca me pecas o “amanhã”. – Ela sorriu e disse que naquele “agora” queria estar comigo.
E assim fomos vivendo um “agora” juntos, quase sempre a 200 à hora, acompanhando a minha maneira de viver. Enganava-me a mim próprio, dizendo que ela gostava, mas reparava num olhar distante e quase triste que por vezes deixava escapar.
Antes de começar a vestir-se disse-me…
– Desculpa, sempre estive errada. Bem sabes que o meu “agora” sempre foi diferente do teu… Desculpa.
– Sempre o soube, mas neste “agora” tinha-te, e era tudo o que me interessava. Adeus, ficarás sempre no meu passado. – Estava a dizer isto e já estava com saudades dela. Lembrar-me-ia do seu rosto, da sua maneira, para sempre.